PESQUISA O médico Felipe, da BP (SP), é um dos estudiosos do tema no Brasil (Crédito: Marco Ankosqui)
Um dos recursos usados para medir o nível de dor física dos pacientes é um cartaz por meio do qual ele aponta, em uma escala, qual das figuras representa a intensidade do desconforto. No hospital americano NewYork-Presbyterian, algo semelhante começou a ser utilizado também para aferir o tamanho da dor. Mas não a física. A espiritual.
Um cartão muito parecido com o adotado para a indicação da sensação física está auxiliando doentes da UTI da instituição a transmitir se e quanto estão sofrendo espiritualmente e o tipo de auxílio que desejam.
A iniciativa faz parte de um movimento que se fortalece e que prevê a incorporação nos tratamentos do cuidado com a espiritualidade. Seu crescimento está ancorado na constatação de que oferecer atenção a esse aspecto da vida produz benefícios importantes para a saúde. E por um caminho que a ciência começa a entender. “Encarar uma doença grave afeta nossa relação com Deus, e nossa relação com Deus afeta a maneira como encaramos a enfermidade”, disse à ISTOÉ o pastor Joel Berning, capelão do New-York-Presbyterian. “O suporte espiritual ajuda ao trazer significado, propósito e transcendência ao sofrimento.”
AVANÇO NO BRASIL
Berning trabalha com os intensivistas. Sua atenção é mais focada nos pacientes conscientes, mas impedidos de falar por estarem sob ventilação mecânica. Apontar no cartaz a figura que melhor representa o nível de sua dor espiritual e receber auxílio – uma prece, por exemplo – significa para a maioria um grande alívio.
Um trabalho feito pelo capelão e o médico Matthew Baldwin deixou isso claro. “A ansiedade dos pacientes caiu mais de 30% imediatamente após a consulta sobre a espiritualidade”, contou à ISTOÉ o intensivista. “Depois da alta, 81% dos pacientes disseram que a assistência tornou a hospitalização menos sofrida.”As instituições brasileiras adotam a tendência aos poucos. “Quando o paciente é indagado sobre suas questões espirituais, percebe que o médico está preocupado com ele, não apenas com seu diagnóstico”, diz o médico Thiago Branco, do Hospital Paulistano, em São Paulo, onde é aplicado um projeto parecido com o americano, com a participação do capelão profissional Robson Pedroso.
“Mesmo com um ateu, é possível trabalhar a espiritualidade, seja na maneira como ele enxerga o universo ou no que ele acredita”, explica Robson. Diagnosticada com câncer de mama em 2016, Francisca de Almeida beneficiou-se com a assistência. “Fiquei menos ansiosa.”As evidências científicas do impacto positivo na saúde do cuidado com a espiritualidade são muitas. Do ponto de vista neurobiológico, sabe-se que há efeitos sobre substâncias associadas ao bem-estar, como a serotonina e a endorfina, resultando principalmente na redução da depressão e da ansiedade. “Além disso, há maior aderência ao tratamento”, afirma o oncologista Felipe Moraes, da BP, Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Coordenador de um encontro sobre o tema realizado na semana passada, ele é co-autor de uma revisão de estudos a respeito do assunto cuja conclusão foi a de que 85% dos pacientes tiveram melhora na qualidade de vida. “Resultados assim mostram que a atenção deve fazer parte da rotina dos tratamentos”, defende o médico Valdir Reginato, da Universidade Federal de São Paulo.
O QUE DIZ A CIÊNCIA
Entre os principais efeitos da prática da espiritualidade sobre a saúde estão:
• menores índices de depressão e de ansiedade
• maior resistência à dor
• maior aderência ao tratamento
• maior comprometimento com hábitos saudáveis
IstoÉ -Cilene Pereira e Priscila Carvalho - 21.07.17
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