Religião é assunto sério. Em decisão que acaba de sair do forno, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou crime de extorsão a ameaça do uso de forças espirituais para obrigar o pagamento por uma cura. O caso aconteceu em São Paulo. A vítima contratou os serviços da acusada por R$ 15 mil. Tempos depois, ela recebeu uma ‘conta’ de mais R$ 32 mil para desfazer ‘alguma coisa enterrada no cemitério’ contra seus filhos.
A responsável pelo trabalho foi condenada a seis anos e 24 dias de reclusão por extorsão e estelionato, em regime semiaberto. No STJ, a defesa pediu sua absolvição ou a desclassificação das condutas para o crime de curandeirismo, ou ainda a redução da pena e a mudança do regime prisional. Alegou ainda que tudo não teria passado de algo fantasioso. Mas perdeu o recurso por unanimidade na 6ª Turma da Corte.
Para o ministro Rogerio Schietti, os fatos são suficientes para configurar o crime de extorsão. “A ameaça de mal espiritual, em razão da garantia de liberdade religiosa, não pode ser considerada inidônea ou inacreditável. Para a vítima e boa parte do povo brasileiro, existe a crença na existência de forças sobrenaturais, manifestada em doutrinas e rituais próprios, não havendo falar que são fantasiosas e que nenhuma força possuem para constranger o homem médio. Os meios empregados foram inidôneos, tanto que ensejaram a intimidação da vítima, a consumação e o exaurimento da extorsão”, disse ao ministro. A declaração consta no site oficial do STJ.
A pena não foi reduzida porque os ministros entenderam que a acusada explorou a fragilidade da vítima e houve prejuízos psicológicos. O STJ determinou ainda a execução imediata da pena. Isso porque, a condenação é em órgão colegiado.
Em relação à desclassificação das condutas para o crime de curandeirismo, previsto no artigo 284 do Código Penal, o ministro destacou o entendimento do TJ/SP de que a intenção da acusada era, na verdade, enganar a vítima e não curá-la de alguma doença.
“No curandeirismo, o agente acredita que, com suas fórmulas, poderá resolver problema de saúde da vítima, finalidade não evidenciada na hipótese, em que ficou comprovado, no decorrer da instrução, o objetivo da recorrente de obter vantagem ilícita, de lesar o patrimônio da vítima, ganância não interrompida nem sequer mediante requerimento expresso de interrupção das atividades.”
O redimensionamento da pena também foi negado pelo relator. Schietti entendeu acertada a decisão do tribunal paulista de considerar na dosimetria da pena a exploração da fragilidade da vítima e os prejuízos psicológicos causados.
Foi determinada, ainda, a execução imediata da pena, por aplicação do entendimento do STF de que seu cumprimento pode se dar logo após a condenação em órgão colegiado na segunda instância.
Processo relacionado: REsp 1.299.021
http://www.carreiradoadvogado.com.br/2017/03/13/ameaca-espiritual-serve-para-caracterizar-crime-de-extorsao/
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