31 julho 2017

A GENUÍNA PREDESTINAÇÃO BÍBLICA

Imagem relacionada

INTRODUÇÃO


João não precisou de muitas palavras, para mostrar que Deus jamais predestinaria alguém à perdição eterna. No prólogo de seu evangelho, ele deixa bem patente que o amor divino não contempla exclusões; é sempre inclusivo. Mais adiante, descreve a ação salvadora do amoroso Pai com esta belíssima declaração do Cristo: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). Logo, se o pecador receber Jesus, herdará a bem-aventurança eterna. Mas, recusando-O, será condenado ao eterno e indescritível suplício. Isso significa, que, até o momento da recusa consciente, nenhuma pré-condenação há contra esse pecador. Ele tanto pode salvar-se, crendo em Jesus, como perder-se, rejeitando-O.


Este é o Plano da Salvação que Jesus, por amar-nos singularmente, consumou no Calvário. Tendo a predestinação como uma de suas principais colunas, é eficaz para livrar-nos do pecado e da ira vindoura. Neste artigo, mostrarei, com a ajuda de Deus, que a predestinação ensinada nas Escrituras Sagradas é sempre salvadora. Os que Deus predestina, predestina-os sempre à salvação. E, quando alguém se perde, perde-se por não haver se curvado ao senhorio de Jesus Cristo.

I. UMA DEFINIÇÃO TRANQUILIZADORA
Se não fosse o rigor extremado da escolástica protestante do século 17, não estaríamos a debater, hoje, com tanta ênfase e desamor, a doutrina da predestinação. Para certos grupos, Agostinho e Calvino têm mais voz do que Paulo, e são mais ouvidos do que o próprio Cristo. Mas isso não deve levar-nos à guerra teológica ou à guerrilha hermenêutica. Deixemos, pois, a Palavra de Deus falar livremente, para que o Deus da Palavra fale com liberdade e redenção.


1. Definição etimológica

A palavra predestinação significa, etimologicamente, destinar antecipadamente. Em o Novo Testamento, o vocábulo grego proorizō, traduzido em nossas Bíblias como o verbo predestinar, traz a ideia de uma ação determinada, ou decidida, de antemão pelo amoroso e presciente Deus. O termo é usado por Paulo, a fim de ressaltar a beleza da salvação em Jesus Cristo (Rm 8.29,30; Ef 1.5, 11).


2. Definição teológica

O predestinacionismo é definido como a doutrina segundo a qual Deus, em Sua inquestionável soberania, predestinou uma parte dos seres humano à salvação eterna, e outra, à eterna perdição. Assim entendia o teólogo francês João Calvino (1509-1564). Em cima dessa proposição, os protestantes, conhecidos como reformados, alicerçaram a sua soteriologia; é a pedra de esquina de todo o seu edifício teológico.


O predestinacionismo é conhecido também como a dupla predestinação.
A predestinação genuinamente bíblica, porém, é o ensino de acordo com o qual Deus, com base em Seu amor e presciência, elege para a vida eterna os que, ouvindo o chamamento da graça, não a resistem, mas, pela fé, recebem Jesus Cristo como o Seu redentor pessoal (1 Pe 1.2; Ef 2:8,9). Logo, os que não atendem ao chamamento do Evangelho destinam-se, a si próprios, à condenação eterna (Jo 16:8-11).



Conforme já dissemos, a predestinação divina é sempre positiva. Deus jamais pré-condenaria alguém ao lago de fogo. Se, por um lado, é soberano, por outro, é amoroso, justo e bom. Quem se perde, perde-se por desprezar o Filho de Deus.


III. A PREDESTINAÇÃO DIVINA É SALVADORA

Na Bíblia Sagrada, não encontramos um versículo sequer, que nos autorize a afirmar ter o amoro Deus predestinado, quer um gentio, quer um judeu, ao lago de fogo. Em todos os casos em que aparece o verbo predestinar, contemplamos o Pai Celeste sempre a eleger, em Seu pré-conhecimento, os que se predispõem, ao ouvir o Evangelho, a crer em Jesus Cristo e a recebê-Lo como Redentor.


1. Eleitos na presciência de Deus

Em sua primeira epístola, Pedro descreve admiravelmente como se dá a nossa predestinação: “eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e a aspersão do sangue de Jesus Cristo, graça e paz vos sejam multiplicadas” (1Pe 1.2).


Desta passagem, infere-se logo que Deus predestinou-nos à vida eterna com base em Seu amor presciente, tendo como parâmetro a nossa atitude frente ao Evangelho. Conhecendo-nos previamente a propensão à Sua graça, aplainou-nos o caminho, para que, no trecho mais oportuno de nossa jornada, viéssemos a encontrar-nos com o Senhor Jesus. Haja vista o ocorrido com Paulo nas proximidades de Damasco (At 9.1-15). Já converso, o apóstolo reconhece haver sido escolhido pelo Senhor desde os seus antepassados (Gl 1:15; 2Tm 1:3).



2. Predestinados pelo conhecimento prévio de Deus

Na Carta aos Romanos, Paulo explica-nos de que maneira Deus nos predestinou à salvação: “Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8.28).


Tão clara é esta passagem, que ela, por si só, é suficiente para deitar por terra todo o edifício da dupla predestinação. Segundo ensina claramente o apóstolo, Deus, antes de predestinar-nos, conheceu-nos. E, só depois de conhecer-nos, foi que nos elegeu à salvação com base nos méritos de Seu Filho, Jesus Cristo. O que experimentamos aqui? A atuação do amor presciente do Pai Celeste.



3. Predestinados para Deus por meio de Cristo

Ao predestinar-nos à vida eterna, Deus não foi movido apenas por Sua inquestionável soberania; moveu-O também, antes e acima de tudo, o Seu inexplicável amor, conforme realça o apóstolo: “nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade” (Ef 1.5).

Deus não nos predestinou meramente à salvação; ao predestinar-nos, adotou-nos como filhos em Seu Filho. E, de forma tão carinhosa e terna, sempre fomos vistos pelo Pai Celeste. Pode haver maravilha maior que esta?



4. O chamamento dos predestinados

Num primeiro momento, Deus nos predestina à vida eterna; num segundo, chama-nos à revelação de Cristo através da proclamação do Evangelho. Ato contínuo, justifica-nos e, quando do arrebatamento, glorificar-nos-á, conforme acentua o apóstolo Paulo: “E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Rm 8.29).


Diante dessa cadeia de ouro, o que fazer? Proclamemos o Evangelho a todos, em todo o tempo e lugar, por todos os meios disponíveis. Ouçam-no todos, indistintamente. Muitos, constrangidos pela mensagem da cruz, receberão o Cordeiro. Quanto aos rebeldes, que se conscientizem do Juízo Final. De posse de um arbítrio livre, desimpedido, mas contumaz e soberbo, rejeitaram o Salvador de todos os homens (1Tm 4:10). Agora, resta-lhes a terrível expectativa do castigo eterno: o lago de fogo (Ap. 20:15). 



 5. A predestinação no conselho da vontade divina

A base da predestinação genuinamente bíblica é o amor de Deus. Amando-nos com um amor ainda inexplicável, estabeleceu um plano para a salvação de toda a humanidade antes mesmo que viéssemos a existir. Atentemos ao que escreveu Paulo aos irmãos de Éfeso: “Nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11).


O maravilhoso conselho mencionado pelo apóstolo contemplava a criação do mundo, a formação do ser humano, a redenção deste e a nossa união eterna com o Pai através do Filho. E, para que o Plano de Salvação se efetivasse, Deus chamou, santificou e preparou dois povos (Gn 12:1-3). No Antigo Testamento, Israel. E, no Testamento Novo, a Igreja (Ef 3:9-11).


IV. A PREDESTINAÇÃO DE ISRAEL E DA IGREJA

Coletivamente, tanto Israel quanto a Igreja foram predestinados a serem povo de Deus. Eles jamais deixarão de ser a herança peculiar do Senhor. Individualmente, porém, cada um, de per si, deve perseverar até o fim, para que seja glorificado com o Senhor Jesus.


1. A predestinação de Israel

Em Abraão, o Senhor predestinou Israel a ser o povo escolhido e santo, por excelência, através do qual todas as famílias da terra seriam abençoadas (Gn 12:1-3). Moisés destaca os israelitas como a propriedade mui particular do Senhor (Dt 7.6). Mais adiante, já no tempo de Isaías, o Deus de Abraão declara amor eterno à progênie de Jacó (Is 44:21; 49:3). O apóstolo Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, confirma a predestinação dos hebreus como povo sacerdotal e profético do Senhor. No fechamento da História Sagrada, todo o Israel (o remanescente fiel e piedoso) será redimido, salvo e glorificado (Rm 11:26).


Se Israel, coletivamente, está predestinado a ser povo de Deus, individualmente, cada israelita é chamado a perseverar nos caminhos divinos até o fim. Por intermédio de Ezequiel, o Senhor é categórico quanto à responsabilidade de cada indivíduo: “A alma que pecar, essa morrerá; o filho não levará a iniquidade do pai, nem o pai, a iniquidade do filho; a justiça do justo ficará sobre ele, e a perversidade do perverso cairá sobre este” (Ez 18:20).



Logo, apesar da predestinação coletiva de Israel, como povo de Deus, ser um fato inquestionável, cada israelita é exortado a permanecer no caminho divino. Caso contrário, não será contato como propriedade do Senhor.



2. A predestinação da Igreja de Cristo

A Igreja, quer você persevere no caminho da santíssima fé, quer dele se desvie, jamais deixará de ser o povo Deus. Formada por judeus e gentios, ela foi predestinada, na mais remota eternidade, a ser a Noiva do Cordeiro (Ef 3.1-21). Por esse motivo, o próprio Senhor instiga-nos a ir até o fim, para que jamais venhamos a perder a salvação (Mt 24:13; Ap 2:10).


Infelizmente, não são poucos os que, apesar de haverem experimentado a salvação, vêm a desprezar o Cordeiro de Deus e a pisar o sangue da Nova Aliança (Hb 10.26-30). Mencionemos, também, os que, nestes últimos dias, apostatam da fé, ignorando por completo o Crucificado (1Tm 4.1). Os tais, apesar de terem feito, um dia, parte da Igreja de Cristo, de Cristo se desviaram. E, assim, deixaram de fazer parte de Seu corpo místico.
Tendo em vista o que acima expusemos, uma pergunta faz-se imperiosa: Pode o predestinado vir a perder a salvação? Antes de a respondermos, vejamos como se dá o processo salvador na vida de quem recebe Jesus como o seu Salvador.


V. O PROCESSO DE SALVAÇÃO

1. A salvação na presciência divina
Deus conhece todas as coisas antes mesmo de estas tornarem-se fatos e proposições. Através de Isaías, Ele fala de Sua presciência: “Lembrai-vos das coisas passadas da antiguidade: que eu sou Deus, e não há outro, eu sou Deus, e não há outro semelhante a mim; que desde o princípio anuncio o que há de acontecer e desde a antiguidade, as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho permanecerá de pé, farei toda a minha vontade” (Is 46.9,10).


Em Sua amorosa presciência, Deus já sabia, desde a mais impensada eternidade, quem haveria de receber o Senhor Jesus Cristo. Por esse motivo, alcançou, através do Evangelho, cada alma disposta a crer. Nós, portanto, fomos eleitos pelo Pai Celeste antes de virmos ao mundo, conforme enfatiza Pedro: “eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e a aspersão do sangue de Jesus Cristo, graça e paz vos sejam multiplicadas” (1Pe 1.2).



A declaração do apóstolo acha-se em perfeita consonância com a de Paulo: “Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8.29).
Tendo em vista as passagens acima transcritas, concluímos que, para eleger-nos à vida eterna, Deus utilizou, em primeiro lugar, o amor, que jamais deixou de ser eterno, e a Sua presciência, que sempre foi infalível. Ele não usaria nenhum critério que viesse a ferir os próprios atributos morais como o amor, a justiça, a benignidade e a misericórdia. Sua soberania, embora absoluta e inquestionável, é regida por tais virtudes. Portanto, o Deus dos santos profetas e dos apóstolos de Jesus Cristo jamais redigiria o chamado decreto horrível. Ou seja: a predestinação de uma parte de Suas criaturas morais, quer anjos, quer homens, ao lago de fogo.



2. O chamamento à salvação
 Sabendo, pois, de antemão quem receberia a Cristo, providenciou-nos Deus o chamamento através da pregação evangélica, conforme muito bem explicita Paulo: “E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Rm 8.30).


Vejamos dois exemplos bastante emblemáticos extraídos dos Atos dos Apóstolos que nos ilustram o texto paulino.
O primeiro é o caso do oficial de Candace, rainha dos etíopes. Do texto sagrado, depreendemos que esse homem ia regularmente a Jerusalém, a fim de adorar a Deus. E, sabendo o Senhor que ele ansiava por salvação, ordenou a Filipe que o evangelizasse (At 8.26-30). Ouvida a palavra da fé, o etíope, recebendo prontamente a Jesus, requer o batismo (At 8.26-30).



Eis, agora, o caso do centurião romano. Este homem austero e grave, fazia continuas orações ao Senhor e, para agradá-Lo, socorria os pobres. Sabendo Deus que o seu coração estava predisposto a aceitar Jesus, ordenou que Pedro o evangelizasse. Diante da proclamação do Evangelho, recebeu a fé, e, de imediato, foi batizado no Espírito Santo e até línguas falou (At 10.44-48).
Todavia, não devemos evitar a pergunta: Mesmo conhecido, eleito e predestinado, pode o crente vir a perder a salvação? Busquemos elucidar a questão que tem incomodado tanta gente.


VI A PERDA DA SALVAÇÃO
Para respondermos a essa pergunta, evoquemos o episódio de Atos que narra o naufrágio do navio que levava Paulo a Roma. O apóstolo, ante a iminência do desastre, exorta tripulantes e passageiros a permanecerem a bordo. Se o escutassem, ninguém pereceria. Caso contrário, perder-se-iam. Que todos estavam predestinados a se salvar, não resta dúvida. Contudo, havia uma condição: conservar-se a bordo (At 27;30,31).


De igual forma, dá-se com o salvo. Que ele está predestinado a salvar-se, não há dúvida. Entrementes, deve perseverar até o fim, conforme recomenda o Senhor Jesus (Mc 13:13). Isso não significa que a perda da salvação é algo corriqueiro e banal na vida do povo de Deus, pois temos a consolar-nos a doutrina da perseverança dos santos.



1. A perseverança dos santos

Embora rejeitemos o ensino da segurança absoluta e incondicional de salvação, temos a consolar-nos a doutrina da perseverança do crente neste '...mundo que jaz no maligno'. Eis como Judas, irmão de Tiago, alenta-nos ante as vicissitudes de nossa jornada: “Ora, àquele que é poderoso para vos guardar de tropeços e para vos apresentar com exultação, imaculados diante da sua glória, ao único Deus, nosso Salvador, mediante Jesus Cristo, Senhor nosso, glória, majestade, império e soberania, antes de todas as eras, e agora, e por todos os séculos. Amém!” (Jd 1.24,25).


Não obstante os perigos que nos cercam a peregrinação à Nova Jerusalém, a Bíblia Sagrada garante-nos que é possível ter, neste mundo, uma vida santa, irrepreensível, testemunhal e confessante, sem tropeços, até chegarmos à presença de Deus. Afiança-nos Paulo: “Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus” (Fp 1:6). Logo, a nossa trajetória espiritual, à semelhança da luz da aurora, vai brilhando cada vez mais, até ser dia perfeito (Pv 4.18).



2. A salvação exige perseverança até o fim

A mesma Bíblia que nos alenta com a doutrina da perseverança, persuade-nos à responsabilidade pessoal. Em suas páginas, o Espírito Santo desperta-nos a perseverar até o fim (Hb 10.38). Ouçamos o Senhor Jesus. Em Seus discursos e alocuções, encoraja cada discípulo a ir até o fim, para que seja total, plena e eternamente salvo (Mt 10.22; 24.13; Mc 13.13).


Já que temos as promessas da eleição e as bem-aventuranças da predestinação, vivamos em permanente oração e vigilância (Mt 26.41). Caso contrário, perderemos a coroa da vida eterna (Tg 1,12; Ap 2.10).


CONCLUSÃO
Predestinados à eternidade com Deus, não tenhamos uma espiritualidade desleixada e leniente. Esforcemo-nos, então, por alcançar a excelência cristã, pois o Pai Celeste espera sempre o melhor de Seus filhos. Eis o que nos recomenda o apóstolo na Epístola aos Hebreus: “Quanto a vós outros, todavia, ó amados, estamos persuadidos das coisas que são melhores e pertencentes à salvação, ainda que falamos desta maneira” (Hb 6.9).

Quanto à possibilidade de o crente predestinado vir a perder a salvação, como alguns de fato a perderam, não vivamos amedrontados, pois temos a ajudar-nos o Espírito Santo. Eis o que Ele promete-nos através do apóstolo: “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8: 28).
Que o Senhor nos ajude a permanecer firmes em seus caminhos, pois, em breve, virá Ele buscar-nos para vivermos na Jerusalém Celeste.


Autor: Pr. Claudionor de Andrade

Uma palavra do Pr. Silas Daniel
Favor ter o cuidado para não torcer as minhas palavras: dizer, como eu disse, que é absolutamente incoerente um assembleiano disseminar o calvinismo em sua igreja, sendo muito mais coerente sair dela, não é a mesma coisa que convidar todos os assembleianos que crêem no calvinismo a sair da AD. Primeiro, porque o que eu disse trata-se claramente de uma opinião pessoal de cunho ético sobre uma situação hipotética, e não de um convite. Eu disse inclusive que se esse fosse o meu caso, eu sairia. Segundo, porque pregar e ensinar o calvinismo na AD é, sim, partir para uma situação de conflito dentro da sua denominação. O confronto se tornaria inevitável caso essa atitude ocorresse. E esse confronto não é ético. E afirmar que não é ético, que não é o comportamento correto, não é convidar ninguém a nada. É apenas afirmar que não é o comportamento correto, e que, portanto, o oposto é o mais acertado.


Se eu fosse um dos líderes da denominação, e alguém interpretasse essas minhas palavras equivocadamente assim, eu até entenderia o erro. Pela posição que eu estaria ocupando, as pessoas tenderiam a interpretar essas minhas palavras dessa forma, querendo ler as entrelinhas. Mas eu nem disse isso e nem tenho posição ou autoridade para que se "viaje" pensando que eu "estaria, no fundo, querendo dizer isso".

Mas, voltemos à questão da ética. Reflitamos: É ético lutar para que minha denominação se curve à minha crença pessoal? Devo confrontá-la por isso? Ou devo, se já não me sinto assembleiano e quero sair pregando e ensinando o calvinismo, ir para uma igreja renovada calvinista ou tradicional?
O que é mais ético?

Mas, se você não quer que olhemos essa questão pela ótica da ética, então olhemo-la apenas de forma prática, realista. Diga-me um só exemplo de uma pessoa que tentou fazer isso e conseguiu mudar toda a posição doutrinária de sua igreja, seja em caso de confronto por doutrina primária (realmente algo muito sério) ou secundária.

Lutero conseguiu com a Igreja Católica? Não. Os protestantes tiveram que sair da Igreja Católica. Arminius conseguiu com a Igreja Reformada Holandesa? Não, os remonstrantes tiveram que sair dela. Wesley com a Igreja Anglicana? Não, ele teve que sair dela. Os calvinistas metodistas com a Igreja Metodista? Não, eles acabaram saindo do metodismo e suas igrejas se tornaram igrejas congregacionais. Os pentecostais conseguiram com suas igrejas de origem tradicional? Os renovados com suas igrejas tradicionais? Sejamos realistas!

O irmão acredita que os irmãos presbiterianos acharão normal se obreiros da sua denominação começarem a ensinar arminianismo lá? Ou os metodistas se o inverso acontecer? Devemos julgá-los “intolerantes” por isso?

Uma coisa é promover “caça às bruxas”, sair investigando e punindo quem pensa pessoalmente diferente dentro da AD; outra coisa é a AD, ou qualquer outra denominação, não aceitar uma promoção interna de divergências doutrinárias. São coisas totalmente diferentes.


 A visão de que a denominação deve deixar livremente que alguns de seus membros ensinem e preguem nos púlpitos ensino diferente da posição oficial da denominação, contanto que eles não estejam ferindo doutrinas bíblicas fundamentais, trata-se de uma saída irreal, absolutamente problemática.


Em primeiro lugar, como já disse, se a Assembleia de Deus passa a subtrair de seu padrão doutrinário todas as doutrinas bíblicas secundárias que a fazem ser o que é, aceitando apenas aquela espinha dorsal que faz com que assembleianos, batistas, presbiterianos, metodistas etc sejam evangélicos – as doutrinas bíblicas fundamentais –, então a AD já deixou de existir. Ela se tornou uma outra coisa, uma igreja sem identidade denominacional. Além de abrir as portas para metamorfoses ambulantes.

Sim, metamorfoses ambulantes, porque se você acha correto que a Assembleia de Deus permita que o calvinismo seja pregado e ensinado em nossas igrejas livremente, então vamos também liberar que alguém ensine em nossas igrejas que o batismo no Espírito Santo não é uma bênção subsequente à salvação, mas, sim, sinônimo da própria salvação; vamos liberar também o ensino em nossas igrejas de que línguas não são evidência nenhuma de recebimento do revestimento de poder do alto; etc. Afinal, todas essas doutrinas as quais me referi são doutrinas secundárias. Nenhuma é doutrina bíblica fundamental, que são aquelas sem as quais sequer podemos ser considerados cristãos.

A Doutrina do Batismo no Espírito Santo não é doutrina fundamental, mas secundária, logo, eu poderia ser assembleiano e discordar dela e até ensinar o contrário dela? A Contemporaneidade dos Dons Espirituais não é doutrina fundamental, mas secundária, logo eu poderia ser assembleiano e discordar dela e ainda ensinar o contrário dela? Se acharmos natural o ensino em nossas igrejas das visões mais variadas em torno de uma doutrina bíblica secundária, por que não fazer o mesmo em relação às outras doutrinas bíblicas secundárias? Um peso, duas medidas? Onde está a nossa “inclusividade”?

Na verdade, como se pode ver, isso não tem nada a ver com ser inclusivo, mas com coerência e identidade denominacional. Uma coisa é reconhecermos que as divergências doutrinárias entre assembleianos, batistas, presbiterianos, metodistas, congregacionais etc são secundárias e nós todos somos irmãos em Cristo, adorando o mesmo Deus e indo para o mesmo Céu. Outra coisa é eu achar que a unidade que Jesus pregou em João 17 significa necessariamente que todas as denominações não devem ter mais internamente uniformidade doutrinária em relação a doutrinas bíblicas secundárias.


Ser tolerante como cristão não é sinônimo de não ter mais posição oficial em questão de doutrinas bíblicas secundárias dentro das denominações, não significa aceitar que haja disseminação de divergências teológicas no seio denominacional. Aliás, já imaginou uma igreja assim? Um dia, se ensina uma coisa; em outro dia, outra; um crê de um jeito, outro de outra forma; o culto para um pode ter isso e aquilo, mas para o outro não, etc. Que confusão!


Em meu livro “A Sedução das Novas Teologias” (CPAD), no segundo capítulo, expliquei que o denominacionalismo é muito bom, que se ter identidades denominacionais, igrejas preservando posicionamentos diferentes em termos de doutrinas bíblicas secundárias, não é um mal, como muitos ingenuamente pensam, mas uma bênção. O mal é a briga entre denominações ou o fenômeno das igrejas sem uniformidade doutrinária. Indico lerem o que escrevi nesta minha obra. Reproduzirei aqui apenas uma pequeníssima parte, e resumida, do que disse ali.

"As igrejas livres ou denominações surgiram em contraposição às igrejas estatais, que eram a forma de governo das igrejas não-católicas logo após a Reforma Protestante. Naquela época, o que não era Igreja Católica era igreja estatal, isto é, uma entidade subserviente ao Estado. Vieram, então, em resposta a essa situação, as igrejas livres ou denominações, que foram uma excelente saída.

Como explica o historiador batista Winthrop Hudson, o termo “denominação” consistia na afirmação de que “o grupo referido é apenas membro de um grupo maior, chamado ou denominado por um nome particular. A afirmação básica da teoria denominacional de Igreja é que a Igreja verdadeira não deve ser identificada em nenhum sentido exclusivo com qualquer instituição eclesiástica particular. (...) Nenhuma denominação afirma representar toda a Igreja de Cristo. Nenhuma denominação afirma que todas as outras são falsas. Nenhuma denominação insiste que a totalidade da sociedade e igreja devem se submeter-se aos seus regulamentos eclesiásticos. No entanto, todas as denominações reconhecem sua responsabilidade pela totalidade da sociedade e esperam cooperar em liberdade e respeito mútuo com outras denominações e cumprir tal responsabilidade”.

Como acrescenta o historiador presbiteriano Antonio Gouveia Mendonça, “a denominação era instrumental na tarefa comum de cristianizar a sociedade, não somente a República, mas o mundo”. Uma bênção!

Foi só muito tempo depois, no período que chamamos de Pós-modernidade, que começaram a surgir críticas ao denominacionalismo como se este fosse um pecado, como se ferisse João 17 etc. Não é verdade. Trata-se de um desconhecimento da história da igreja e do propósito original do denominacionalismo.

O denominacionalismo não é um sistema perfeito, mas é o melhor sistema para a saúde organizacional da Igreja em sua manifestação visível. O sistema organizacional de igreja única universal (Igreja Católica) não funcionou e não funciona; o sistema de igreja estatal para tentar manter a unidade doutrinária absoluta, também não. O ideal são igrejas livres, as denominações, cada uma com a sua característica e jeito de ser, com suas visões diferentes em relação a doutrinas bíblicas secundárias, até porque é impossível unificar todos em torno de uma única visão acerca de doutrinas bíblicas secundárias - a história já mostrou isso sobejamente. Temos que aprender a conviver com essas diferenças, que não são fundamentais. Devemos respeitar as diferenças denominacionais e não pregar que o denominacionalismo é pecado.


Pode e deve haver, pois é super sadio e bíblico (Totalmente João 17!), a comunhão entre as denominações, a unidade em pontos comuns, o trabalhar juntos em pontos comuns. Esse tipo de discussão e crítica é muito sadio e bíblico. Já combater o conceito de denominação, de identidade denominacional, já é exagero. Defender uma igreja com perfil doutrinário flexível para abrigar todas as posições denominacionais não funciona nem prática nem na teoria.


As denominações surgiam antes por divergência de ideias, nada mais. Eram divergências honestas. Hoje, não: a maioria das novas denominações surge com finalidades financeiras. Isso, sim, é imundo.

Lembremo-nos que a unidade da Igreja na Terra não implica necessariamente uniformidade total. Na Igreja do Novo Testamento, havia diversidade de ministérios (1Co 12.4-6) e variedade de opiniões acerca de assuntos de importância secundária, como vemos de Romanos 14.1 a 15.13. Além disso, “embora houvesse uniformidade nas convicções teológicas básicas (1Co 15.11, BLH; Jd 3), a fé comum recebia ênfases diversas, segundo as diferentes necessidades percebidas pelos apóstolos (Rm 3.20; cf. Tg 2.24; Fp 2.5-7; cf. Cl 2.9ss)”, lembra o teólogo escocês Bruce Milne, professor de Teologia Bíblica e História no Spurgeon College em Londres, em seu livro “Conheça a verdade” (1987). Foi apenas pós-Constantino que tentaram unificar tudo sob o guarda-chuva de uma única igreja: a Igreja Católica Apostólica Romana. Deu no que deu.

A existência de denominações, cada uma com sua independência e seu próprio perfil, mas respeitando cada uma as doutrinas bíblicas fundamentais, é uma bênção.

Assim como o regime democrático não é perfeito, mas é o melhor sistema de organização da sociedade, o denominacionalismo se mostrou o mais saudável sistema de organização eclesiástica. Claro que há exemplos negativos dentro do denominacionalismo, mas eles só provam que o sistema é imperfeito porque o ser humano é falho, e não que o sistema denominacional é tão ruim quanto os outros dois ou, muito menos, o pior. A História já provou que, dos três sistemas, o denominacionalismo ainda continua sendo o melhor para acomodar as naturais diferenças humanas.

O sistema de igrejas não-denominacionais, sem padronização doutrinária, não é a saída, mas um tremendo perigo, uma porta aberta para a paulatina fluidificação doutrinária na comunidade cristã. É isso que acontece na prática. O ser humano é assim. Isso é realismo.

Portanto, que a AD continue sendo a AD, que a Metodista continue sendo a Metodista, que a Presbiteriana continue a ser a Presbiteriana, que a Batista continue sendo a Batista etc. E o crente que, por convicção, não se sentir mais bem na Presbiteriana, por não concordar mais com sua visão doutrinária, que vá para outra denominação onde se sente bem. E o mesmo com o crente de qualquer outra igreja, inclusive a AD. A outra opção é ou manter sua convicção pessoal divergente, mas sem confrontar sua denominação, o que é incoerente, mas aceitável; ou confrontar a denominação, o que é mais do que incoerente.


Finalmente, irmãos, eu não conheço nenhuma AD – pelo menos ligada à CGADB – que seja calvinista ou ensinando calvinismo aos seus membros. Se o irmão conhece, favor me dizer. E o que citei sobre esfriamento não é “achismo”, não é teoria. Como asseverei na entrevista, é um dado empírico. Há uma denominação pentecostal, não grande como a nossa, que era, desde suas origens, arminiana e deixou de ser, e está sofrendo aquelas consequências de que falei na entrevista ao Gutierres. O calvinismo foi imposto lá pelo líder da igreja. Essa igreja não é uma igreja neopentecostal. Soube até que, mais recentemente, decidiram retirar o título “pentecostal” do nome da igreja e das placas das igrejas.


Não sei se isso acontecendo hipoteticamente com a AD (passar de arminiana a calvinista, algo que acho muitíssimo difícil de um dia acontecer), ela passaria pelas mesmas consequências. Mas é fato que casos de despentecostalização existem, são concretos, não "achismo".

Em Cristo,

Silas Daniel



Uma exposição do irmão José Pinheiro

Paz a todos! Fiz o caminho contrário; entrei no Evangelho pelas portas de uma Igreja presbiteriana clássica e fiz cerca de um ano de discipulado, lendo muito a Bíblia, é claro, mas também autores como RC Sproul, John MacArthur, Paul Washer, Lloyd-Jones e muitos outros. Tornei-me um cessscionista convicto e até fanático, infelizmente. Repetia como um papagaio que pentecostalismo era heresia e que calvinismo nada mais era que o próprio Evangelho. À época, só fui apresentado, para mostrar qual era o "outro lado" a sujeitos como RR Soares, Edir Macedo, Malafaia, como se não calvinistas fossem todos pelagianos ou, pior, hereges. 

Não conhecia Roger Olson, Donald Gee, Silas Daniel, Ciro Zibordi, Wesley e, é claro, o próprio Armínio. Tudo mudou quando uma noite, na igreja da minha esposa, que nem pentecostal é, mas uma batista tradicional, o Espírito Santo agiu de forma avassaladora e até em línguas comecei a falar. Meu racionalismo exagerado caiu por terra, assim como minhas falsas certezas. Muito confuso, busquei explicações e um irmão me indicou um ótimo livro, "Surpreendido pelo poder do Espírito" e mesmo muito desconfiado e reticente, comecei a ler e...quantas aberturas mentais, que sopro de ar puro e fresco. Dali voltei sempre às Escrituras e começou minha libertação do feitiço do genebrino. 
Li vários livros de autores arminianos, molinistas ou apenas estritamente bíblicos e todo um mundo se descortinou. Romanos 9 não tem apenas uma leitura, a calvinista, que hoje considero - com todo respeito SOS representantes dessa corrente soteriológica - sombria e, como dizia Dave Hunt, uma má representação do Deus da Bíblia. Sim, Ele é Santo e Soberano, mas é Amor e não dá para separar - a não que seja para facilitar o estudo - um atributo de outro. 
Como bem acentua Roger Olson, o verdadeiro Arminianismo não quer defender pura e simplesmente o livre arbítrio do homem e sustenta também a tese da depravação total, mas defende a ação da Graça Preveniente como fundamental para preservar o autêntico caráter do Deus das Escrituras. 

Concluindo, hoje sou um assembleano convicto, membro de uma igreja local muito séria, com manifestações de dons do Espírito, mas com ordem e reverência. Estou feliz e embora ache que não um problema em haver assembleanos serem calvinistas, que devem ser respeitados como irmãos em Cristo que são,não gostaria de ver a denominação tomada por Calvino e seus seguidores que, lamentavelmente, têm a tendência de dividir a Igreja com seus chicotes teológicos de "caçadores de heresias", vi isso do lado de lá e sei do que falo. 

Por outro lado, eu jamais, repito JAMAIS,vi qualquer pentecostal, ou mesmo wesleyano, pregar em uma das igrejas calvinistas pelas quais passei, enquanto o oposto não é tão incomum, como se pode aferir nas pregações de Hernandes Dias Lopes, por exemplo, em Assembléias de Deus. Isto já demonstra o sectarismo e o elitismo dos seguidores do Reformador genebrino. Dois pesos e duas medidas, acepção de pessoas? Não mais de minha parte. Que preguemos a Cristo,e esse Crucificado! Sou bíblico, não arminiano ou calvinista? Paz a todos e perdoem meu longo testemunho, mas se Deus quiser, talvez possa ser útil a alguém.

Fontes:
-A genuína predestinação bíblica Revista Obreiro Aprovado -Nº 78
-Geremias do Couto
-Teologia Pentecostal
-Surpreendido pelo poder do Espiríto Santo

Nenhum comentário:

Postar um comentário