Alvo do Pr. Malafaia é abrir mega igrejas em São Paulo
O pastor carioca Silas Malafaia, 54, está com a faca na mão. Serra ao
meio uma segunda baguete enquanto anuncia sua "visão expansionista".
"Vou abrir igreja no Brasil inteiro, minha filha", afirma, enquanto toma
lanche no intervalo de um dos dois cultos que celebrou no fim da tarde
de terça-feira, no Rio. Planeja inaugurar mil templos até 2020 --toca
hoje oito obras pelo país, a um custo de R$ 25 milhões.
Um dia com Silas Malafaia
São Paulo é prioridade. "Logo, logo" vai "cair com tudo" na cidade.
"Tenho pesquisado lugares. Não posso ter igreja para menos de 4.000
pessoas lá."
O líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, ramificação da
Assembleia de Deus, maior grupo evangélico do país, lambuza o pão com
margarina e corta uma fatia de queijo minas. Revela que está hoje à
frente de 125 igrejas e de um rebanho de 36 mil fiéis. "Nosso
crescimento é formiguinha, 'vambora', pá, pá, pá. Mas vamos chegar lá",
diz, entre goles de café com leite e suco de abacaxi.
É na base do "pão, pão, queijo, queijo" que o pastor diz levar a vida. E
uma proeza ele já conseguiu na capital paulista: virou a estrela da
eleição municipal. Pautou o debate por uma semana ao dar apoio a José
Serra, do PSDB, e dizer que iria "arrebentar" o petista Fernando Haddad
por causa dos materiais para combater a homofobia preparados pelo MEC
--que chama de "kit gay".
A Folha revelou que o tucano distribuiu material semelhante em
São Paulo quando era governador --mas nem assim Malafaia mudou seu
"voto". Para ele, Serra "não é um grande orador, mas transmite
sinceridade". Já Haddad é "sa-fa-do".
Ao mesmo tempo, Malafaia diz que "não é criança" para "vender seus
princípios" a partido "x" ou "y". No Rio, por exemplo, é PT: apoia o
senador Lindbergh Farias para o governo do Estado em 2014. Já o
governador Sérgio Cabral (PMDB) recebe polegar para baixo por não vetar
"leis trabalhistas que beneficiam homossexuais, monte de porcaria".
Afirma se opor à "cultura de privilégios" disseminada "pelos ativistas
gays".
"O pessoal pensa que sou um radical xiita? É tudo gay, vamos metralhar,
'pou, pou'? Não!", diz enquanto simula com a mão um fuzilamento. Ele
quer é converter o pessoal. E defende que a igreja seja "pronto-socorro"
para quem quer deixar de ser homossexual. "Deus não fez bissexuais nem
andróginos, fez macho e fêmea. Sinto repulsa. Aquilo é uma perversão."
Se um de seus três filhos (Silas, Talita e Taísa) fosse gay? "Amaria
100% e discordaria da prática 100%."
Em 2010, Malafaia estampou centenas de outdoors no Rio. Ao lado de sua
foto, lia-se: "Em favor da família e da preservação da espécie humana".
Acha que "ninguém nasce gay. Cadê a prova do cromossomo homossexual?".
Essa condição seria "aprendida ou imposta pelo ser humano, um ser de
'copiagens' de comportamento".
São 19h quando Silas Malafaia termina a refeição e volta ao púlpito para
o segundo culto do dia na sede de sua igreja, na periferia da cidade.
Pede ao público que aplauda Anna Virginia Balloussier. "Tem uma repórter aqui da Folha.
Quando jornalista pede pra vir, digo que a gente não tem nada a
esconder." Cerca de 2.000 fiéis batem palmas. Alguns gritam "amém". Sua
imagem aparece no telão ao discursar.
Vaidoso, se diz "pobre, mas limpinho". Revelou à coluna que fez implante
no cabelo em 2011. "Tinha umas 'careca'. O tapa-buracos aqui foi
legal", afirma, apalpando onde ficavam as entradas. Lembra que seu
médico, de Recife, também atende José Dirceu. "Mas não tenho nenhum elo
com esse cidadão, pelo amor de Jesus Cristo."
Malafaia está há três décadas na TV. Hoje compra horários na programação
de Band, RedeTV! e CNT e é dublado em canais dos EUA (ele queria
aprender inglês, "mas cadê tempo, com essa vida louca?"). Ele se
reconhece como um dos líderes religiosos mais acessíveis à imprensa -dá o
número do celular e "a cara a tapa" a quem for.
Não raramente saem faíscas dessa relação. Naquele dia, no início da
pregação, citou um jornalista que falou "do absurdo da igreja em usar
cartão de crédito ou débito [para pagar o dízimo]". "Engraçado, pra ir
'prum' motel pode usar cartão, pra comprar bebida também. Pra dar
oferta, não? Vai ver se tô na esquina, vai plantar batata!"
Por ano, a Assembleia de Malafaia arrecada oficialmente R$ 50 milhões
com ofertas. Ele calcula que 60% sejam quitadas por meio de máquinas da
Cielo. "Era um preconceito miserável em relação a nós. Como se constrói
templo? Como se paga despesa? Desce anjo do céu e fala, 'taqui',
pastor?"
A voz do orador com 30 anos de experiência ricocheteia pelo ambiente. Na
primeira fila, de bata rosa estampada, está sua mulher, a pastora
Elizete(foto abaixo), 53, com quem se casou, "virgem", aos 21 anos. Às vezes aponta o
dedo para o lado ao pregar, como uma versão gospel de John Travolta no
musical "Grease - Nos Tempos da Brilhantina". "Tem gente que pensa que
igreja é formada de 'analfabestas', um bando de idiotas manipulados pelo
maior malandro possível que é o pastor. Como se ninguém aqui fosse
formado em nada."
Meia hora antes, no lanche com outros pastores, aproximou a boca do
gravador da repórter para criticar a Folha. "Um cara faz um editorial
elogiando o 'kit gay'. Ou é demente ou é petista mesmo, com vontade.
Editorial ri-dí-cu-lo!" Gesticula a ponto de quase encostar na comida
seu terno de US$ 470, comprado na Flórida ("esse, no Brasil, custa entre
R$ 3.000 e R$ 4.000").
A birra com "o seu Haddad" aumentou nos últimos dias. "A minha bronca é
que ele agora vem com conversa fiada de que sou o submundo quando fala
de misturar religião e política."
Conta que, em 2010, foi procurado pela então candidata à Presidência
Dilma Rousseff. Teria passado 15 minutos com ela ao telefone explicando
que não a apoiaria por causa da polêmica do aborto --ela já havia dito
em entrevistas que defenderia a descriminalização, posição da qual
recuou na campanha.
Foi de Serra. Mas a presidente Dilma, depois de eleita, o cativou.
"Diante de mais de 3.000 prefeitos querendo redistribuir royalties do
petróleo, ela não afinou, não. Gostei de ver, é estadista."
Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek são admirações. Lula também, "mas
essa imagem tem caído um bocado. O cara faz acordo com [Paulo] Maluf. E
descia o pau, na época de líder sindical, nesses caras da ditadura".
"Em 1989, apoiei Leonel Brizola e depois Lula, quando ele era o Diabo no
meio evangélico. Na época, o [bispo Edir] Macedo chegou à igreja
[Universal], abriu a camisa escrita Collor e chamou Lula de Diabo." Em
2003, virou o representante evangélico do "conselhão" de Lula, o
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Não foi convidado
pessoalmente pelo presidente, e sim indicado por parlamentares. "Lá, eu
era o cara. Agora, sou o submundo da política."
"Já viu o jogo como é? Humanistas, ateus, filósofos, operários,
sindicalistas, líderes comunitários... Todo mundo pode falar. Aí os
'esquerdopatas', quando fala um pastor... 'Não mistura religião com
política.' Que história é essa? Sou cidadão e pago imposto. Tenho
direito de manter minhas falas baseadas nas minhas crenças."
E ele gosta de falar. Formado em teologia (Instituto Bíblico
Pentecostal) e psicologia (universidade Gama Filho), aposta que é o
pastor que "ganha as ofertas mais altas" para falar em conferências. "De
R$ 3.000 a R$ 100 mil." Há 25 anos, diz, abriu mão de um salário da
igreja. Estima que hoje estaria recebendo R$ 70 mil mensais.
De família tradicional de pastores da Assembleia de Deus, filho de um
ex-combatente da Marinha e de uma pedagoga, assumiu a liderança da
Vitória em Cristo em 2010, com a morte do sogro.
Ele e a mulher vivem numa casa de dois andares num condomínio na zona
oeste do Rio, com a empregada "há 26 anos conosco" e uma cadela da raça
labrador que Malafaia não lembra o nome. Têm como vizinhos "o coroa"
(Ary Fontoura) e "aquela menina que apresenta um programa de sexo"
(Fernanda Lima).
Com a repórter Anna Virginia Balloussier
Morar em SP? "Deus me livre!" Ainda assim, a cidade é o queijo para a
faca em sua mão. "Há um apelo muito grande, e eu vou chegar lá", afirma,
pondo fé em sua "abrangência nacional". "Não tenho medo de dar minha
cara a tapa, não estou nem aí se alguém não está gostando. Não estou em
concurso de beleza."
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